Os consumidores que estão emergindo da pandemia estarão mais focados em conforto, cuidados com a saúde e no consumo sustentável. Esta é a impressão dos debatedores do Happy Hour com Tecnologia realizado pelo IBTeC na noite de 16 de setembro. Sob a coordenação do vice-presidente executivo do Instituto, Dr. Valdir Soldi, o encontro reuniu o CEO da Top Shoes Brasil Group, Gustavo Dal Pizzol; o gerente sênior do segmento de calçados da BASF, Heitor Barbosa, e o diretor de 2D Materials (2DM, Singapura), Dr. Ricardo de Oliveira. O vice-presidente executivo do Instituto, Dr. Valdir Soldi, será o mediador.
Ricardo de Oliveira iniciou contando sua trajetória. Disse que sua ida para Singapura tinha como objetivo trabalhar na universidade como professor e pesquisador, para criar aplicações utilizando o grafeno como material. No trabalho, compararam mais de 200 tipos de 70 empresas diferentes, praticamente tudo o que era ofertado no mercado à época. Como viram que não existia material de qualidade no mercado, decidiram fabricar seu próprio grafeno. E conseguiram fazer um negócio economicamente interessante com grafeno de altíssima qualidade, com rendimento muito interessante.
A partir de então, transferiram a empresa para um parque tecnológico com apoio do governo de Singapura, que tem programas para apoiar startups, por dois anos. Até 2019, quando passaram a contar com apoio de um investidor estratégico, a empresa brasileira que CBMM, que opera no mundo inteiro, e desde janeiro de 2020 estão produzindo uma tonelada de grafeno por mês. Hoje a 2D Materials está apta a fornecer o material para muitas aplicações, passando por tintas e revestimentos e na área de compósitos, especialmente os poliméricos, que seriam os mais interessantes para o setor calçadista.
Ricardo de Oliveira afirma que a perspectiva de sua empresa é de usar o grafeno para ajudar outros materiais a terem performances únicas.
Ao mesmo tempo, explicou que o grafeno, por ser um nanomaterial, está longe de atingir seu total potencial. Por isto, o crescimento é exponencial na utilização da nanotecnologia no nosso dia a dia. A perspectiva é de que a adoção do grafeno vai apresentar crescimento de 10 a 12% ao ano, independentemente da pandemia.
Sobre o futuro do consumo, o empresário disse entender que os produtos vão ter cada vez mais tecnologia embarcada, seja em componentes eletrônicos ou em novos materiais, e esta diferenciação do que é um componente estrutural e o que é um componente eletrônico, vai desaparecer. E citou o exemplo dos automóveis, onde o próprio chassi, para-lama e teto tendem a ser baterias carregadas pelo sol - “uma realidade que logo fará parte da nossa vida, e isto é uma tendência irreversível”. Outra questão colocada por Ricardo de Oliveira “é o sensoriamento, que vai estar presente cada vez mais em nossas vidas, seja de sensores em nosso telefone celular, na roupa, calçado, casa, em tudo”. E prevê que a sustentabilidade das soluções é imprescindível.
Gustavo Dal Pizzol fez um breve relato da história da Top Shoes, que tem 16 anos de mercado, enfatizado ser uma empresa de inovação, especializada em tecelagem 3D. De acordo com o diretor, a técnica foi adotada em praticamente tudo o que faz, por acreditarem que seja a tecnologia do futuro. Design, tecnologia e matérias-primas sustentáveis são os três pilares da Top Shoes, em qualquer projeto que venha a concretizar no mercado, de acordo com o diretor. Desde 2018 a Top Shoes trabalha em busca de novos mercados - hoje o calçado responde por cerca de 80% da produção.
Além de cabedais, a empresa atuou em 2020 no desenvolvimento de uma linha de máscaras, tornozeleiras, entre outas. A 3D está iniciando em setembro de 2020 um projeto de impressoras em 3D de alta produção. Não é para prototipagem; o objetivo é performar em volume. Hoje estão com 100 impressoras, e o projeto é chegar a 1.000 máquinas no prazo de dois anos.
A BASF, empresa líder mundial no segmento químico, foi fundada na Alemanha, há 155 anos. “Na América do Sul são 109 anos criando soluções e contribuindo para melhorar o mundo. Nós criamos a química para um mundo sustentável. E provamos que é possível combinar o sucesso econômico com responsabilidade social e ambiental”, afirmou o gerente sênior do segmento de calçados da BASF, Heitor Barbosa. De acordo com o palestrante a BAF está em quase todos os setores em quase todos os países do mundo, “e praticamente tudo o que é consumido hoje no mundo tem algum produto da BASF em sua cadeia de valor”.
Em relação ao setor calçadista, Heitor Barbosa afirmou que “existe todo um carinho da BASF com o mercado calçadista. A empresa construiu uma relação muito parceria com o setor ao longo dos anos”. Sobre a estrutura da empresa, “nós hoje temos a melhor equipe da indústria para tender o mercado calçadista, com profissionais experientes e dedicados que ajudam nossos clientes a construir valor”. Afirmou ainda que “a BASF é um parceiro sustentável para aquelas indústrias que procuram se diferenciar no mercado, pautados nos pilares como sustentabilidade e inovação”.
Quando questionado sobre as aplicações que o grafeno pode ter no setor de calçados, Ricardo de Oliveira afirmou que são possíveis diversas aplicações que antes não eram, como transformar um polímero que é isolante térmico e elétrico em um material que conduza eletricidade e calor tanto quanto um metal. Sobre como vamos usar o grafeno no calçado, ele responde que de diversas maneiras. A primeira é solucionando problemas simples, característicos dos próprios materiais que compõem o calçado, como melhorar a resistência à abrasão, melhorar o conforto térmico com troca de calor mais eficiente. Nos calçados de segurança, biqueiras e solados de aço - o grafeno já tem substituído partes metálicas com sucesso em calçados de segurança . Também inovações disruptivas, como a utilização de compostos de grafeno para criar solados produzidos em camadas que tenham função de geração de energia. Solados que você pode utilizar para carregar o celular durante uma corrida, por exemplo. Também a parte de sensoreamento, com nanosensores que podem ser adicionados a tintas, fibras e nos próprios polímeros, que feitos de grafeno são extremamente finos e leves.
Os eletrônicos vestíveis, como logotipos da marca com sensores que vão medir temperatura e batimentos cardíacos, por exemplo. O grafeno é um dos materiais que poderão habilitar estas tecnologias, esclareceu o diretor da 2D Materials.
Uma das questões que ainda precisam ser solucionadas em relação ao grafeno, segundo Ricardo de Oliveira, “hoje estamos trabalhando para implantar normas para o setor. O grafeno funciona, mas você tem que encontrar o produto correto para a sua necessidade, explicou.
Quanto a custos, Ricardo de Oliveira chamou a atenção pra o fato de que “hoje, o custo deste material já é um décimo do que era há três anos”. Quanto à utilização do material, hoje a indústria de bens de consumo já está habilitada usar o material em seus produtos. No caso de calçados, o uso de grafeno no solado contribuir para aumentar de forma muito significativa a resistência à abrasão, por exemplo.
O uso do grafeno na produção de calçados de segurança traz benefícios como a resistência á perfuração, péla alta resistência que ele confere ao material.
Sobre materiais e tecnologia de futuro, Gustavo Dal Pizzol falou que o knit vem crescendo a cada semestre, pela sua função de redução do uso de mão-de-obra no processo de produção. Lembrou que a pandemia provocou enxugamento das estruturas nas empresas, aumentando a demanda por knit, uma forma rápida de ativar coleções de novos produtos. E salientou a contribuição do material para a sustentabilidade - são peças que saem prontas da máquina, sem produzir resíduos, o que implica em redução muito grande de desperdícios de matérias-primas.
A tecnologia permite que se faça flexibilidade e espessuras diferentes em pontos diferentes do calçado, tudo em uma única peça, em uma única operação. Acredta que até agora utilizou-se apenas 10% do que é possível fazer com o knit. Ainda há muitos fios a serem explorados com esta tecnologia. Na opinião de Dal Pizzol, “o knit veio para otimizar a indústria, para reduzir processos, mas principalmente para trabalhar com materiais diferentes, com uso de nanotecnologia. Citou exemplo do fio antiviral lançado recentemente pela Rhodia. Lembrou ainda que “em um futuro muito próximo, será possível introduzir nanochips dentro da estrutura do cabedal, por exemplo, para medir temperatura, fazer leitura de pressão arterial, entre outros.
Heitor Barbosa afirmou que “a tendência para o futuro é reduzir a complexidade na produção de calçados. E lembrou que o poliuretano permite junção com tecnologia do knit 3D como uma inovação e quebra de paradigma. A expectativa é de que haja mudança das indústrias de calçados com muita mão-de-obra para um sistema mais simples e tecnológico. Ainda sobre materiais, afirmou que o poliuretano expandido para calçados esportivos de alta performance, trouxe a possibilidade de criar tênis muito mais leves e simples de produzir. Agora, a BASF conta com um novo material, Infinergy, que permite a junção com o knit, com alta performance, baseado na premissa do material que devolve energia, e não absorve. Com isto, economiza energia para praticar mais esporte.
A BASF também tem sua linha do TPU 3D, que permitiu o desenvolvimento de um conceito de chinelo completamente inovador, totalmente em PU, que só foi possível porque além das tecnologias tradicionais, tem a tecnologia do TPU com impressão em 3D para a produção das tiras. E lembrou que trata-se de uma revolução em termos de design, que poderão passar a imprimir suas criações em 3D.
Sobre tendências de consumo, Heitor lembrou que “hoje a população hoje vem tentando viver e envelhecer com mais qualidade. As pessoas praticam mais esportes, em busca de uma vida com mais qualidade. E como isto se traduz para o mercado calçadista? Existe uma tendência de substituição de calçados tradicionais, para os esportivos, de alta performance e com mais conforto. As mulheres estão trocando os saltos altos por calçados mais confortáveis. Nossa tradução da demanda para o futuro é por calçado confortável e de melhor qualidade.” Para responder esta demanda, a BASF trouxe para o portifolio uma linha de poliuretano de altíssima resiliência, que tem propriedades mecânica muito altas para calçados esportivos, que permite acabamento e toque muito diferenciado em relação ao que está no mercado hoje, e permite uma variação de solados para a construção de calçados mais leves.
Já Gustavo Dall Pizzol entende que “o mercado está mudando, com empresas trabalhando em produtos de maior valor agregado. A pandemia acelerou o futuro, trazendo demandas que demorariam para chegar”. Acredita na mudança de mercado, da visão empresarial, fazendo menos quantidade de calçados e tendo melhor resultado financeiro. A retomada do mercado, não só do calçado, se dá em um clima em que todo mundo pensando em forma de melhor resultado. Dal Pizzol acredita na modernização dos parques fabris. Com isto, o Brasil deverá ficar mais competitivo em níveis de exportação. Está acreditando em boicote europeu em relação à Ásia, e ainda há a questão entre EUA e China. “Se formos competentes, vamos ocupar espaço muito importante como fornecedores de calçados no mercado externo, e hoje temos tecnologias que permitem contornar a questão do custo da mão-de-obra, a partir destas novas tecnologias que estão postas”.
Ainda sobre tendências para o futuro, Dal Pizzol prevê que “marcas com mais funções voltadas à sustentabilidade, menos focadas na moda fast fashion, deverão ganhar espaço no mercado”. Também prevê o crescimento no relacionamento direto do consumidor com as marcas. “São acelerações que ocorrerão de uma forma mais rápida do que a gente esperava”. O empreendedor acredita também na customização de produtos, com a personalização cada vez mais como uma realidade para as marcas. E sustentabildiade vai ser uma obrigação no futuro muito próximo, preconiza.
Para finalizar o evento, o vice-presidente do IBTeC convidou para as próximas programações da instituição, dentro da programação da Semana do Calçado, que será realizada de 5 a 8 de outubro, pelas plataformas digitais da entidade.